segunda-feira, 16 de novembro de 2015

QUASE METADE DOS PRESOS É SOLTO NO MESMO DIA EM POA

DIÁRIO GAÚCHO 15/11/2015 | 23h02


48% dos presos em flagrante são soltos no mesmo dia em Porto Alegre. Falta de vagas nos presídios é uma das razões para que os detidos respondam a processo em liberdade. Legislação, baixo potencial ofensivo e escassez de provas também são causas das solturas




Em três meses, 717 pessoas foram beneficiadas com liberdade provisória entre 1,5 mil detidos em Porto Alegre Foto: Diego Vara / Agencia RBS


José Luís Costa



De cada cem presos em flagrante em Porto Alegre, 48 são soltos em até 24 horas para responder ao processo em liberdade. O número se tornou conhecido a partir de estatística do projeto audiência de custódia – interrogatório preliminar que afere a legalidade das prisões. Nas demais capitais, a média de soltura é semelhante (46%), conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Em três meses de audiências em Porto Alegre – começaram em 31 de julho –, 1.501 pessoas foram detidas em flagrante, sendo 784 mantidas presas e 717 beneficiadas com a liberdade provisória. Nesse período, ao menos cinco delas voltaram a ser presas em flagrante.

O que leva a esses números? Escassez de provas na lavratura do flagrante? Pode ocorrer. Crimes de baixo potencial ofensivo cuja pena não prevê prisão? Também acontece. Mas há outro fator apontado por quem critica as solturas: a falta de vagas nas cadeias, fato que inclusive influenciou na flexibilização da legislação.

Em 2011, o governo federal sancionou uma lei, fruto de projeto de 2001, que ampliou o rol de crimes afiançáveis e permitiu substituir a prisão provisória por outras medidas, como o uso de tornozeleira.

– A legislação tende a deixar livres autores de crimes de menor gravidade, mas tem traficante sendo solto – lamenta o promotor Luciano Vaccaro, coordenador de Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público (MP).

Vaccaro assegura que o MP tem se insurgido contra decisões judiciais que liberam autores de crimes graves, mas enfrenta barreiras legais – como o habeas corpus, que tende a levar à soltura por decisão liminar. Já para reverter uma ordem de liberdade, o MP deve apresentar recurso em sentido estrito, sem efeito suspensivo. Ou seja, é preciso esperar o julgamento de mérito que pode demorar meses. O promotor diz ser possível agilizar o pedido agregando um mandado de segurança, mas, segundo ele, o Tribunal de Justiça do Estado (TJ) não tem acolhido essas solicitações, diferentemente do que ocorre na justiça paulista.

Professor universitário e doutor em direito penal, Aury Lopes Junior avalia como elevado o número de prisões. Para ele, o índice de solturas pode ser sintoma de detenções ilegais ou desnecessárias.

– A polícia precisa refletir sobre isso – pondera.

O delegado Marcelo Moreira, diretor do Departamento de Polícia Metropolitana, argumenta que a própria Polícia Civil filtra casos que chegam às delegacias e não são levados adiante por falta de provas. Já o coronel da Brigada Militar Mário Ikeda, comandante do Policiamento da Capital, ressalta que a situação leva ao retrabalho, com capturas reiteradas dos mesmos autores de furtos e roubos.

– Isso gera a sensação de impunidade – diz Ikeda.

O juiz Sidinei Brzuska, da Vara de Execuções Criminais da Capital, afirma que o saldo das prisões é consequência de interpretações dos magistrados que atuam nos plantões. Ele ressalta que é preciso ter bom senso e medir consequências ao decidir pelo encarceramento.

O juiz lembra que pessoas humildes, sem amparo familiar, ao chegar na cadeia, são transformadas em bandidos perigosos pelas facções.





































"Administramos uma situação caótica", diz Eduardo Almada, juiz corregedor do TJ 





Como o senhor avalia o fato de 48% dos presos em flagrante serem soltos no mesmo dia?

A grande questão hoje é o déficit prisional muito grande. Além disso, a legislação processual penal estabelece que a regra geral é responder ao processo em liberdade ou por medidas alternativas. Se o crime não envolve violência à pessoa ou não é grave, o preso é solto.

Nem todos os presos em flagrante são levados para audiência de custódia?
Os juízes dos plantões nos dizem haver situações que não justificam a manutenção da prisão. Eles não querem que o cidadão passe pelo constrangimento de permanecer uma noite na prisão até ser conduzido no outro dia para audiência, quando eles estão percebendo que esse encarceramento não se justifica. Essa é argumentação dos juízes do plantão quando cobramos deles. Vou te dar um exemplo fictício: uma pessoa é flagrada com uma moto que foi objeto de furto, e ela não tem antecedentes. A chance de ter sido enganada e comprado a moto de boa fé é muito grande. Então, o que os juízes pensam é que eles podem, com os elementos de que dispõem, liberar uma pessoa mesmo que ela tenha sido presa em flagrante.

Após as audiências, 84% são mantidos presos.
O juiz leva para audiência os casos em que há dúvidas, em que é preciso ouvir o preso. Na audiência, acaba resolvendo a dúvida, e, em geral, em favor da sociedade, ficando naturalmente preso um número maior de pessoas.

Em três meses, houve casos de pessoas presas duas, três vezes.
Se um punguista, aquele que bate carteira, for preso em flagrante, e o objeto do roubo for devolvido à vítima, é considerado um delito sem gravidade. Não vão deixá-lo preso com a superlotação carcerária que se verifica hoje. Só que a punga é a profissão dele. Solto, ele vai voltar para a rua e continuar cometendo aquele tipo de delito. Não tem como resolver a questão. Estamos enxugando gelo. Administramos uma situação caótica. Não temos vagas para os presos no semiaberto. As pessoas estão batendo na Susepe todas as semanas atrás de vagas.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É UMA VERGONHA!!! E as justificativas dadas são afrontas à inteligência, aos direitos individuais e coletivos, aos riscos de morte enfrentados pelos policiais, e ao clamor de uma população refém da violência e da criminalidade. Uma das alegações da justiça é a falta de presídios, mas para que servem os órgãos da execução penal que não apuram a responsabilidade, uma das obrigações previstas na Lei, para processar e punir os culpados por isto? Ou a justiça não é tão independente como falam e é fraca para impor deveres ao poder político?

Afinal, qual são os deveres e qual é o compromisso dos poderes, instituições e órgãos de justiça para com os direitos das vítimas, do cidadão, das comunidades e dos policiais? A justiça brasileira faliu, burocratizou, lavou as mãos e se tornou corporativa, separada, leniente, parcial e condescendente, em que só enxerga os direitos de uma parte, a do coitadismo, sem se ater à função precípua da aplicação coativa das leis, à finalidade pública da justiça e à supremacia do interesse público em que a vida, o patrimônio e a liberdade das pessoas são prioridades máximas. Estão alimentando a IMPUNIDADE, o crescimento do crime, a desmoralização do esforço policial e o terror nas comunidades que estão estressadas, a mercê da violência e pedindo socorro.

O QUE IMPEDE O PODER JUDICIÁRIO DE APURAR RESPONSABILIDADE, PROCESSAR E PUNIR OS CULPADOS PELA FALTA DE UNIDADE PRISIONAIS E PELO DEPÓSITO DE PRESOS SOB SUA SUPERVISÃO EM CONDIÇÕES DESUMANAS? Está na lei esta competência....

Art. 66. Compete ao Juiz da execução:
VII - inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento e promovendo, quando for o caso, a apuração de responsabilidade;



É A FALÊNCIA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, DA JUSTIÇA E DOS DIREITO DO CIDADÃO E DA POPULAÇÃO À SEGURANÇA PÚBLICA. Qual é a razão do povo brasileiro continuar custeando poderes, instituições e órgãos públicos com altos salários, auxílios exorbitantes, gratificações, indenizações milionárias e suas máquinas burocratas e inoperantes no atendimento de deveres, obrigações, finalidade e eficiência, sem deixam de observar a supremacia do interesse público em que a vida, o patrimônio e a liberdade são prioridades máximas?. É revoltante para as vítimas destes bandidos, para as comunidades aterrorizadas e para os policiais que arriscam a vida para prendê-los. É REVOLTANTE PARA A NAÇÃO BRASILEIRA.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

O MAIOR PROBLEMA DO BRASIL





ZERO HORA 11 de novembro de 2015 | N° 18352



DAVID COIMBRA




Leio que houve aumento do número de assassinatos de mulheres de 2003 para cá. Olhando assim, superficialmente, esse dado não faz sentido. Nessa fatia de tempo, entrou em vigor a Lei Maria da Penha, foram criadas secretarias e um ministério especial para as mulheres, novos e muito atentos grupos feministas se disseminaram pelo país, e uma mulher foi eleita e reeleita presidente da República.

Os números estariam errados?

Não.

Os números foram desaparafusados de uma engrenagem maior e mais complexa. É que, nesses últimos anos, a violência aumentou exponencialmente no Brasil em todos os estratos da sociedade. O Brasil, que tinha graves problemas de segurança pública desde os anos 1980, tornou-se, nos anos 2000, um dos lugares mais perigosos do mundo, mesmo não enfrentando guerra interna ou externa.

As causas? São inúmeras. Entre elas, a leniente Constituição de 1988.

Mas, se a violência aumentou em geral, será que se tornou ainda maior contra as mulheres? Decerto que sim. Num país violento, os mais fracos são as vítimas preferenciais.

Tempos atrás, um juiz americano disse para um amigo meu que aqui, nos Estados Unidos, “em primeiro lugar estão as crianças, em segundo os velhos, em terceiro as mulheres, em quarto os cachorros, e por último os homens”. Ainda assim, se uma mulher ou até uma criança cometerem algum ilícito, a punição virá tão certa quanto o título do Corinthians neste ano.

É um princípio correto. Os mais fracos têm de ser protegidos dos mais fortes, e a lei tem de valer para todos.

No Brasil, ninguém é protegido de nada. Então, todos ficam expostos.

Como resolver essa tragédia? Bem. Eu, que já lancei meu programa para a educação e para o Cais Mauá, lanço agora meu projeto para a segurança pública. Aí vai.

1. Mais presídios. Se a impunidade é um dos maiores problemas, punir é preciso. Mas, para punir, há que se dispor de estrutura. Um dia, escrevi que no Brasil de hoje são necessários mais presídios do que universidades. E é verdade. Primeiro, por humanidade. Para não deixar centenas de milhares de homens vivendo em masmorras medievais. A condição dos presos do Brasil é uma vergonha para nós, brasileiros. Segundo, para poder punir. Eu espalharia presídios pelo Brasil. Confortáveis, amplos e seguros presídios, que pudessem abrigar dos corruptos do governo aos batedores de carteira da Praça XV.

2. Novo Código Penal. Há que endurecer-se a lei, sobretudo nos crimes contra a pessoa, sem perder a ternura.

3. Valorização do pessoal. Seria indispensável treinar, aparelhar e valorizar o sistema penal, desde os policiais até os juízes. Os policiais, obviamente, têm de ganhar salários melhores.

4. Educação. Lugar de criança é na escola. Compulsoriamente. Obrigatoriamente. Definitivamente.

5. Drogas e aborto. O Congresso teria de discutir a liberação da maconha e do aborto. Ambas as questões têm de ser de saúde, não de polícia.

Em cinco anos, o Brasil seria outro, muito mais seguro. E eu lhe garanto, assustado leitor: o maior problema do Brasil é a segurança pública. Saúde, educação e reformas tantas são importantes, mas é a falta de segurança que mais dói. Se esse problema for resolvido, pelo menos 60% dos dramas dos brasileiros desaparecerão. Mulheres, crianças, velhos, homens e até cachorros viverão melhor. Empresto de graça o meu programa para quem quiser levar.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Parabenizo o David Coimbra pelo reconhecimento público de que a segurança pública é o maior problema do Brasil e pelo projeto que sugere para melhorar este cenário de extrema violência e criminalidade no Brasil. Disse quase tudo. No projeto, esqueceu  o mais importante que é o sistema de justiça criminal que dá estrutura, instrumentos e processos para executar e aplicar o código penal e as leis, humanizar e construir mais presídios, exigir responsabilidade na execução penal, garantir a autonomia técnica das forças policiais e valorização dos policiais, manter as crianças nas escolas, combater o tráfico e promover campanhas educativas e de tratamento contra o malefício das drogas.

sábado, 31 de outubro de 2015

NÃO TRABALHAMOS NA SEGURANÇA PÚBLICA



ZERO HORA 31 de outubro de 2015 | N° 18341


ENTREVISTA


“Não trabalhamos na segurança pública”


PAULO AUGUSTO DE OLIVEIRA IRION - Juiz da Vara de Execuções Criminais da Capital



Responsável pela decisão que concedeu prisão domiciliar ao suspeito, o juiz Paulo Irion diz que a medida cumpre a lei.

Como é possível um homem com três condenações por estupro estar em prisão domiciliar?

Desde 2009, toda progressão ao regime aberto se converte em prisão domiciliar. É o esgotamento do sistema prisional. Vale para todos. É uma decisão corriqueira na VEC.

Em se tratando de um estuprador não se poderia tê-lo mantido preso?

Não, porque se ele atende aos requisitos, a lei tem de ser cumprida. No caso dele, pesou o fato de que, desde 2004, não comete delitos. Ou seja, no momento da progressão, tinha mais de 10 anos sem outro crime. Foi um dos elementos levados em consideração.

Em prisão domiciliar, corre-se o risco dele voltar a estuprar.

Aí, vai responder pelo novo crime. É a regra do jogo. Não trabalhamos na segurança pública para evitar que outros crimes ocorram.

VIOLÊNCIA SEXUAL. Suspeito de estupros em série é preso, de novo. SETE ATAQUES nos últimos 12 anos teriam sido praticados por homem que cumpria pena em casa

Condenado três vezes por estupro, cujas penas somadas chegam a 15 anos, Esequiel da Silva Porto, 33 anos, foi preso mais uma vez ontem e deve ser indiciado por dois novos ataques cometidos entre junho de 2014 e outubro deste ano. O homem, que também é suspeito de outros dois estupros – ainda sob apuração – cumpria prisão domiciliar desde fevereiro.

Por quatro vezes, a Justiça entendeu que ele merecia progressão de regime das penas que cumpria. Nesses relaxamentos, fugiu: foram quatro escapadas entre 2013 e 2014, quando estava no regime semiaberto. Em junho de 2013, danificou uma tornozeleira eletrônica. Um dos últimos ataques atribuídos a ele ocorreu enquanto era foragido, em junho de 2014.

– Agora esperamos que, com tudo isso, com pelo menos mais dois casos comprovados, ele fique no regime fechado por um bom tempo – afirma a delegada Marina Dillenburg, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Gravataí.

Em cumprimento de mandado de busca na residência onde Porto morava com a mãe, no bairro Palermo, em Gravataí, a polícia encontrou bolsas, sutiãs e outros objetos femininos, que seriam recordações guardadas das vítimas dos ataques.

Duas horas após revistar a casa, os policiais localizaram Porto sob a ponte que liga Cachoeirinha à Capital, onde havia passado a noite.

– O que fiz? É mentira isso que estão dizendo. Foi tudo de boca. Estão inventando, é mentira – afirmou aos policiais da Deam e do Grupamento de Operação Especiais (GOE), que prestaram apoio.

– A última vítima o reconheceu sem sombra de dúvida – afirma a delegada, acrescentando que o suspeito sempre usava faca ou arma de fogo nos atasques.

A partir do relato da mulher, a delegada identificou semelhança com um caso de 2014. Porto acabou reconhecido por foto pela vítima daquele estupro. Para tentar comprovar outros casos, foi recolhido material genético de pertences de Porto para comparação com amostras recolhidas das vítimas.


LEANDRO RODRIGUES



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- SE A JUSTIÇA NÃO TRABALHA NA SEGURANÇA PÚBLICA, QUAL É A SUA FINALIDADE PÚBLICA NA APLICAÇÃO DAS LEIS, NOS PROCESSOS, NA EXECUÇÃO PENAL E NA GARANTIA DE DIREITOS À POPULAÇÃO?
 

Porém, não se pode culpar o magistrado e sim a cultura leniente e permissiva praticada dentro da justiça de que são instrumentos separados e não comprometidos com o direito dos cidadãos e das comunidades à segurança pública. Só que fazem parte de um sistema em que a justiça é o pilar de sustentação na aplicação das leis e na garantia de direitos, inclusive os de justiça para as vítimas e o de segurança para TODOS na preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.
A justiça trabalha sim na segurança pública, pois o Brasil se constitui num Estado Democrático de Direito e o papel do judiciário é garantir a democracia, as leis, a justiça e os direitos. Afinal para que servem os bem pagos instrumentos de justiça? Quais são as obrigações dos órgãos da execução penal? Deixar criminosos e psicopatas nas ruas cometendo crimes?

MUDANÇA DE POSTURA JUDICIAL, REFORMA DA JUSTIÇA BRASILEIRA E APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE NA EXECUÇÃO PENAL. Por uma urgente mudança de postura na justiça com uma reforma ampla dos instrumentos e da legislação, além da devida apuração de responsabilidade dos órgãos da execução penal diante do "esgotamento do sistema prisional".

terça-feira, 27 de outubro de 2015

AINDA SOBRE A CRIMINALIDADE

JORNAL DO COMÉRCIO, 26/10/2015.

 

Gaspar Marques Batista


Sei porque sou um septuagenário e vivi aquele tempo, mas foi em 1967 que o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a entender que não era mais obrigatória a prisão preventiva de denunciados por homicídio. De lá até hoje, a lei penal e a jurisprudência vêm evoluindo no sentido da descriminalização, da obstaculização da prisão, da complicação do processo, preocupados seus agentes, cada vez mais, em não estabelecer diferenças entre os cidadãos.

Joga-se a culpa da alta criminalidade sobre os ombros das autoridades de segurança, evitando-se admitir que vivemos um estado de impunidade e que a solução passa por leis penais mais severas, a exemplo de sociedades cultural e economicamente mais adiantadas e que anualmente recebem milhares de brasileiros para visitar seus museus, suas praças limpas, admirar suas histórias e seu modo de vida e frequentar suas universidades. Esses milhares de brasileiros não indagam se nesses lugares maravilhosos são confinados perpetuamente, ou até exterminados, os criminosos irrecuperáveis? Só se deleitam com tanta evolução.

É execrável punir alguém com a morte ou a prisão perpétua, mas fosse essa a solução brasileira em matéria penal, muitas vidas teriam sido poupadas neste ano no Rio Grande do Sul. No fim de semana, muitas vidas foram ceifadas, e quase sempre empunhando a arma trucidade, estará um homem que já praticou outros crimes, sempre perdoado pela falta de leis, de um processo mais humano, de vontade de punir, de prisões. Sim, de um processo mais humano, de um processo mais preocupado com as vítimas, porque estas também são humanas, e que estabeleça uma clara diferenciação entre cidadãos criminosos e cidadãos de ficha limpa.

Não seria necessário gastar tanto em segurança se houvesse mecanismos punitivos capazes de intimidar essa pequena população de criminosos, que estão dizimando as pessoas de bem deste País. Será que só valem a liberdade e a dor do torturado e são insignificantes a vida e o sentimento de solidão dos familiares dos vitimados por esses criminosos cruéis?

Desembargador

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

TUMULTO DE PRESOS EM DELEGACIA DO RS



ZERO HORA 19 de outubro de 2015 | N° 18329.


DETENTOS REVOLTADOS.


Área Judiciária do Palácio da Polícia registra tumulto

Com a falta de vagas no sistema prisional, 28 presos estão em celas de delegacias de Porto Alegre. Na tarde de ontem, novamente ocorreu um tumulto na carceragem da Área Judiciária do Palácio da Polícia. Conforme o diretor do Departamento de Polícia Metropolitana, delegado Marcelo Moreira, alguns presos bateram nas grades e jogaram comida nos policiais. Também impediram a limpeza do local.

Atualmente, estão em delegacias presos que possuem condenações. Já os presos provisórios são encaminhados para o Presídio Central, após a Justiça levantar parcialmente a interdição.

Na quarta-feira, uma briga irrompeu entre os 17 presos que estavam no xadrez da 2ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (2ª DPPA). Nenhum preso deveria estar ali, nas celas. O normal seria que, horas depois de detidos, fossem conduzidos ao Presídio Central. Desde meados da década de 1980 os presos do Estado só ficam em presídios e nenhuma delegacia é autorizada a guardá-los, por falta de condições sanitárias e de segurança.

O problema é que o Central não está recebendo detentos desde terça-feira. O motivo é uma interdição automática da Justiça, acionada quando a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) não consegue transferir quem está na casa prisional há mais de 24 horas.

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

UM OLHAR SOBRE OS SISTEMAS ORGANIZACIONAIS



JORNAL DO COMÉRCIO 01/10 às 19h11min


Ana Roig



O pensamento sistêmico, introduzido pela teoria geral dos sistemas, criada pelo biólogo Von Bertalanffy no início do século passado, continua vivo. Ao afirmar que um sistema é um conjunto constituído por partes em interação e interdependência, a forma sistêmica de ler o mundo torna-se aplicável a diferentes campos do conhecimento e a relações de múltiplas naturezas, desde as presentes no organismo humano, nos diferentes espaços sociais e mesmo nas máquinas. Aqui, detenho-me nas relações presentes nos sistemas de natureza social e, mais especificamente, nas organizações empresariais.

As empresas, enquanto espaços de produção de bens e serviços úteis à sociedade, são sistemas sociais formados por pessoas que interagem internamente para atingir objetivos comuns.

Fechando um pouco mais a angular, e usufruindo de mais um entendimento da teoria dos sistemas de que estes formam "filhotes", tem-se a ideia de que uma empresa, enquanto sistema social, contém diferentes subsistemas, formados pelos chamados colaboradores organizados segundo diferentes funções. Esses, por sua vez, estão entre os que operam nas atividades-fim, empenhados na entrega final dos bens e serviços à sociedade, e entre os encarregados das atividades-meio, os que se dedicam às funções administrativas e de gestão, empenhados em suprir as condições ideais para o funcionamento organizacional.

Dedico-me, agora, aos que atuam nas atividades-meio. São os que levam para o dia a dia da empresa as decisões tomadas em nível estratégico pela alta administração. São os que operam na dimensão tática e operacional. São os gestores e os técnicos administrativos. São os que "carregam o piano", em sintonia com a tomada de decisão. Comprometem-se, juntamente com a empresa, no atendimento àqueles que atuam nas atividades-fim e, ao mesmo tempo, àqueles que destas usufruem, tanto em nível interno como externo. Nas empresas, são os que, no discurso organizacional, formam um sujeito composto, articulado pelo pronome nosso, que inaugura a fala sobre a razão social de ser de uma organização: "nosso compromisso é ...".








Relações públicas e professora da Pucrs

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA INDICAM ABUSO POLICIAL

DIÁRIO GAÚCHO 23/09/2015 | 07h02


Justiça imediata. Nos primeiros 20 dias de atuação da Justiça no Presídio Central de Porto Alegre, 31 presos relataram ter sofrido violência policial




Novo modelo permite que juiz olhe no olho do preso antes de autorizar a prisão Foto: Júlio Cordeiro / Agencia RBS


Eduardo Torres



O homem entrou na sala de audiências montada dentro do Presídio Central praticamente se arrastando. Tinha pouca força para falar e dificuldade até mesmo para respirar. Vestia uma camiseta que parecia ter sido simplesmente colocada sobre ele, visto que o homem mal conseguia erguer os braços. O auto de prisão em flagrante registrava: resistiu à prisão, sendo necessário o uso da força.



— A situação dele não correspondia ao que estava relatado no flagrante, então não teria como confirmar a prisão. Ele disse que foi agredido pelos PMs a socos e pontapés. Havia visíveis sinais de espancamento que precisam ser investigados — detalha o juiz Sidinei Brzuska.

Juiz percebe

Colocadas em prática para humanizar os processos criminais deixando o suspeito frente a frente com um juiz antes que a prisão seja homologada, as audiências de custódia têm revelado que esse caso está longe de ser uma exceção.

Um relatório do Conselho Nacional de Justiça fechado com dados dos primeiros 20 dias das audiências na Capital aponta que nesse período, 12% (31 casos) dos 243 autuados em flagrante que chegaram ao plantão do Fórum reclamaram de maus-tratos por parte dos policiais.


Eles foram encaminhados, com os vídeos das audiências, ao Ministério Público e à Corregedoria da BM para que sejam apurados. O volume médio diário de casos relatados é o mesmo de São Paulo, onde as audiências de custódia tiveram início em fevereiro.

Quando o juiz percebe que as lesões não correspondem ao relatado no exame de corpo de delito o caso é levado adiante.

— É um número bem elevado, mas não pode ser considerado conclusivo. O uso da força em muitos casos é necessário e, em boa parte dos casos em que encaminhamos as informações para serem melhor investigadas, isso não anula a prisão em flagrante. Muitos desses presos relatam as agressões, mas já foram medicados e o que motivou a prisão se configura — aponta o juiz Vanderlei de Olindo.

Casos de agressão ganham novo olhar

A criação das audiências de custódia já é vista como um marco pela Defensoria Pública. Segundo o núcleo de Direitos Humanos do órgão, os relatos de violência policial no momento das prisões é uma realidade que já era observada nos flagrantes. O que mudou agora foi o olhar.


Sem as audiências de custódia imediatas — até 24 horas depois da prisão —, o juiz plantonista confirmava ou não os flagrantes baseado unicamente nos relatórios policiais. Ele só teria contato com o preso na primeira audiência de instrução, que poderia levar meses. Casos de agressão escapavam dessa percepção.



— Com o magistrado tendo a oportunidade de analisar o preso e as condições em que ele foi conduzido, o caso ganha celeridade e credibilidade. Acredito que até mesmo a conduta policial tende a melhorar com esse procedimento — afirma a coordenadora do núcleo de defesa criminal da Defensoria, Carolina Zago.

Aumentam os enfrentamentos

Entre os relatos de agressões, pelo menos um elemento chama a atenção do juiz Vanderlei de Olindo. Quase sempre, os agredidos colecionam outros antecedentes.

— Raramente um primário relata ter sido agredido. Não diria que isso é decisivo para determinar a veracidade de uma agressão, mas é sintomático que alguém, já tendo sido preso, resista a uma nova detenção — avalia o magistrado.

Mesma observação faz o corregedor da Brigada, tenente-coronel Jéferson Jaques.

— Não creio que tenha aumentado a violência do policiamento nas ruas, mas a resistência dos suspeitos aumentou.
Quando uma denúncia chega à corregedoria, o primeiro passo, segundo o oficial, é verificar se o caso é compatível com a realidade. Depois, instala-se um inquérito policial militar.

— Em casos com comprovação de tortura vai para a Justiça comum — explica o corregedor.

As audiências de custódia

- No primeiro mês, 382 autuados em flagrante foram apresentados à Justiça.

- 105 desses presos foram liberados sem a necessidade da audiência de custódia.

- 277 passaram por audiências de custódia e 39 deles receberam alvarás
de soltura.

- Até o dia 19 de agosto, quando 159 presos haviam passado por audiências, 31 registraram possíveis agressões policiais.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- O PROPÓSITO DESTAS AUDIÊNCIAS É PARA COIBIR O CRIME OU PARA INIBIR A AÇÃO POLICIAL?  NESTAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA, CADÊ AS VERSÕES DAS VÍTIMAS, DOS POLICIAIS CONDUTORES E DA AUTORIDADE QUE LAVROU O FLAGRANTE?

De nada adianta o uso de um instrumento idealizado para "humanizar" e agilizar a justiça, continuar burocrata e parcial, dando mais importância ao texto em papel e ao depoimento do réu do que os depoimentos das vítimas e das autoridades e agentes do Estado envolvidas no caso. Assim, a cada prisão, os culpados serão as vítimas e os policiais. Os bandidos continuarão sendo "vítimas da sociedade", os policiais seus "torturadores", e as vítimas os "azarados e "ostentadores".

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

JUIZ EXPLICA O PRENDE-E-SOLTA EM POA E DÁ COMO PROBLEMA A FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL



RADIO GUAÍBA, 05 agosto 2015 - 18:02



Lucas Rivas/Rádio Guaíba




Após críticas da BM, juiz explica critérios para prende-e-solta de detidos na Capital



Por dia, cerca de 15 detidos dão entrada no Central após terem a prisão convertida em preventiva

Após o comandante de Policiamento da Capital, tenente-coronel Mário Ikeda, ter reclamado, ontem, em entrevista à Rádio Guaíba, da soltura de presos pela Justiça, em até 24 horas, um juiz plantonista do Foro Central esclareceu, hoje, à reportagem, os critérios tomados pelo Judiciário para manter um criminoso detido.

De acordo com o juiz Victor Santana Souza Neto, os casos são analisados desde que haja legalidade na prisão em flagrante, ou seja, se o preso foi detido cometendo o crime, após o delito, em perseguição ou foi encontrado em seguida, com os pertences levados da vítima. Em caso contrário, o flagrante é relaxado, esclarece.

Souza Neto garante, porém, que em casos de flagrante comprovado, a prisão pode ser convertida em preventiva, dependendo da gravidade do delito – como roubo a mão armada, com faca ou até por meio de agressão. Outros crimes violentos, como homicídio, latrocínio, estupro, trafico de drogas e Maria da Penha, geralmente, mantêm os detidos no sistema carcerário até o julgamento – ou seja, sem hipótese de fiança. Os prazos podem variar de seis meses a quatro anos, por exemplo.

A prática de outros crimes, como furtos de carro, estabelecimentos ou contra pessoas, além de embriaguez ao volante, posse de arma ou de drogas e estelionato podem resultar na liberdade do apenado, reconhece o juiz. Porém, medidas cautelares podem ser impostas nesses casos, como a exigência de fiança, uso de tornozeleira eletrônica ou proibição para frequentar determinado local.

Depois de contextualizar o dia-a-dia dos flagrantes analisados, o juiz garante que prisões seguem sendo convertidas em preventivas, mesmo com a superlotação do sistema prisional.

“Eu particularmente acho que os juízes estão mantendo presos aqueles que realmente devem se manter presos. O problema que me parece que ocorre é a falência do sistema prisional, pois se nós tivéssemos estabelecimentos adequados para ficar com essas pessoas aguardando julgamento, a situação seria bem diferente”, concluiu.

O problema do Presídio Central, por exemplo, é que quase 60% dos 4,2 mil apenados já foram condenados – o que exige a transferência deles a outras prisões. Por dia, porém, cerca de 15 apenados dão entrada no local após terem a prisão convertida em preventiva. Desde o início de agosto, um acordo permite que eles fiquem no Central por, no máximo, 30 dias, em vez de 24 horas, como estabeleceu a Justiça, ainda em 1995. Esse acordo fica em vigor até setembro, quando o governo estadual espera ter liberado o uso de alas em presídios novos em Canoas e Charqueadas.

Além disso, o magistrado pondera que, para cada caso, outros critérios também devem ser levados em consideração, como o histórico criminal do preso ou se ele detém residência fixa.



Fonte:Lucas Rivas/Rádio Guaíba


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- O magistrado aponta exatamente as causas desta impunidade do prende-e-solta: a leniência da justiça, as leis permissivas e o sistema prisional. Quanto ao sistema prisional a falência está na omissão dos poderes e órgãos da execução penal que não exercem seus deveres, em especial a apuração de responsabilidade na execução penal, e não há resposta, continuidade ou soluções nas instâncias superiores do Judiciário, do MP e da Defensoria em relação às denuncias das autoridades, dos juízes e promotores VEC e as constantes nas várias reportagens sobre a calamidade prisional.
É lamentável assistir e ler manifestações dos juízes sobre algo que eles têm competência para apurar, processar e responsabilizar, visto que a execução penal está sob supervisão do judiciário e os presos ficam à disposição e decisões dos juízes. O sistema prisional não deveria ser argumento para medidas que incentivam a impunidade, o retrabalho dos policiais, a revolta das vítimas e o terror na população.

sábado, 1 de agosto de 2015

AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIAS ACELERAM DECISÕES


Audiências de custódia aceleram decisões sobre presos provisórios em Porto Alegre. Com interrogatório dos detidos em menos de 24 horas após a detenção, prática abrevia uma espera que poderia variar de semanas até alguns meses

Por: Marcelo Monteiro
ZERO HORA 31/07/2015 - 17h07min



Juiz Victor Santanna de Souza, ao lado de uma imagem que simboliza a Justiça: "momento histórico" Foto: Júlio Cordeiro / Agencia RBS


Com os olhos cobertos por uma venda, a imagem que simboliza a Justiça remete à ideia de um Judiciário cego: em tese, os réus, sejam que for, devem ser tratados da mesma forma, com imparcialidade e sem distinção. No Brasil, o principal defeito atribuído ao sistema judiciário não é a cegueira, e sim a letargia. Mas, na tarde desta sexta-feira (31), a Justiça gaúcha deu o primeiro passo para alterar esta imagem: exatamente às 14h31min, iniciou-se a primeira audiência de custódia da história do Presídio Central, em Porto Alegre.

Em apenas 10 minutos, o juiz Victor Santanna de Souza decidiu pela homologação do flagrante de Alef Willian Castro da Silva. Preso por roubo menos de 24 horas antes – às 15h15min da quinta-feira, na altura do número 1.515 da Avenida Praia de Belas, na Capital –, o contador de câmara fria contou ao magistrado, com voz baixa e mansa, que alterna 20 dias de trabalho em Bagé com alguns dias de folga em Porto Alegre. Na quinta, na companhia de uma "ficante", decidiu assaltar para garantir um dinheiro extra.

– Eu tava precisando de dinheiro pra sair – disse Alef, sentado no centro de uma sala com não mais do que 20 metros quadrados, ocupada por 14 pessoas, incluindo juiz, promotor, defensor, assistentes judiciários, escrivães, técnicos de informática e policiais militares.


Às 14h41min, depois de um breve diálogo com o detido, o juiz avisou-o de que decidira pela manutenção de sua prisão preventiva. Além de antecedentes por violência doméstica, diz o magistrado, Alef não comprovou ter residência fixa ou manter alguma atividade lícita, embora tenha dito trabalhar em um frigorífico. Para completar, pesou sobre o detido a suspeita anterior de participação em um homicídio.

– Esta conduta não é uma coisa isolada na tua vida – sentenciou o juiz, ao decidir pela manutenção de prisão preventiva.

Adotadas para garantir a rápida apresentação dos presos em flagrante a um juiz, de acordo com o estabelecido em tratados internacionais de direitos humanos assinados pelo Brasil, as audiências de custódia visam a solucionar uma falha histórico do Judiciário nacional. Levados ao magistrado no dia seguinte à prisão, os detidos têm a sua situação definida rapidamente, abreviando um tempo de espera que, antes da adoção deste modelo, podia demorar de semanas até vários meses.

Nesta sexta-feira, em apenas 32 minutos (incluindo breves intervalos), foram realizadas quatro audiências de custódia – em todos os casos, os detidos foram mantidos em prisão preventiva. As audiências duraram entre quatro e 10 minutos. No total, serão realizadas 16 audiências no dia.

– Estamos vivendo um momento histórico – afirmou o juiz Victor Santanna de Souza. – Esta prática não irá resolver imediatamente os problemas da criminalidade ou a superlotação dos presídios, mas acredito que, no médio e longo prazo, vai resultar em uma mudança cultural, com reflexos na ação policial e, em um segundo momento, na manutenção como presos apenas daquelas pessoas que ofereçam risco efetivo à sociedade.

Como foram as audiências

Confira os quatro casos acompanhados por ZH. No total, foram 32 minutos, incluindo rápidos intervalos:

Audiência 1
Duração: 10 minutos
Detido: Alef Willian Castro da Silva
Preso em flagrante por: roubo
Antecedentes: violência doméstica e suspeita de participação em homicídio
Decisão: prisão preventiva mantida

Audiência 2

Duração: 8 minutos
Detido: Luís Felipe Furquim Lopes
Preso em flagrante por: roubo
Antecedentes: tráfico de entorpecentes
Decisão: prisão preventiva mantida

Audiência 3

Duração: 7 minutos
Detido: Juliano Gomes Bonifácio
Preso em flagrante por: porte de arma (revólver com numeração raspada)
Antecedentes: tráfico de entorpecentes
Decisão: prisão preventiva mantida

Audiência 4
Duração: 4 minutos
Detido: Marcelo Nunes Silveira
Preso em flagrante por: assalto a ônibus
Antecedentes: não informado
Decisão: prisão preventiva mantida

quarta-feira, 1 de julho de 2015

COM CENTRAL SUPERLOTADO, DELEGACIAS VIRAM CADEIAS


Superlotação no Presídio Central mantém mais de 20 detentos em delegacias Ronaldo Bernardi/Agencia RBS
ZERO HORA 01 de julho de 2015 | N° 18211


SISTEMA PRISIONAL



A falta de vagas no Presídio Central acarreta na superlotação de delegacias de Porto Alegre e da Região Metropolitana. Devido à demora para serem remanejados para outras instituições penitenciárias, pelo menos 24 presos em flagrante estavam trancafiados, até o início da noite de ontem, em celas que deveriam ser provisórias, sem banho e até sem alimentação.

Por volta das 11h, a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) informou que os presos começavam a ser transferidos para presídios da Região Metropolitana. O órgão disse que estava providenciando alimentação para os detentos.

Delegacias de Viamão, Alvorada e Gravataí reuniam nove presos na manhã de ontem, calculou o diretor da 1ª Delegacia Regional Metropolitana (DRM), delegado Eduardo Hartz. Em Canoas, sete pessoas estavam detidas. Também ontem, na Capital, oito presos chegaram a ser mantidos no Palácio da Polícia. Segundo o delegado Cléber Ferreira, diretor interino do Departamento de Polícia Metropolitano, medidas extremas poderão ser tomadas:

– São presos que estão há 48 horas aqui, sem alimentação, sem banho. E não podemos permitir visitas. A vontade é orientar que deixem de autuar em flagrante. Não temos onde colocar esses presos.

Segundo a Defensoria Pública, presos preventivamente que não estão sendo encaminhados ao Central são mantidos em delegacias sem direitos preservados – sem água, comida e visitas.

– Temos, agora, a superlotação nas delegacias. E o caminho, se isso seguir, será soltar esses presos, uma vez que estão em uma situação de absoluta indignidade – afirmou o defensor público Sérgio da Silva Fraga Júnior.

De acordo com Fraga Júnior, as condições se complicam ainda mais devido à falta de orientações por parte da Susepe.



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Depois da pessoa ser presa, ela passa a disposição da justiça. Cadê a Justiça?  Execução penal falha, sem vagas e desumana, por que não apuram a responsabilidade?

quinta-feira, 28 de maio de 2015

DELEGADO DE POLÍCIA É HIPOSSUFICIENTE

Revista Consultor Jurídico, 28 de maio de 2015, 8h00


Senso Incomum. Para Defensoria Pública do RS, delegado de polícia é hipossuficiente!


Por Lenio Luiz Streck





Leio que no Rio Grande do Sul uma delegada de polícia é defendida por seis defensores públicos, que, segundo diz o Ministério Público — que está processando os referidos defensores por improbidade administrativa — foram ao encontro da policial para lhe oferecer os serviços da instituição. A própria delegada confirmou que foi contatada por um defensor público, que afirmou que “a defensoria entendia” que a delegada estava sendo vítima de perseguição pelo MP. Isso está nos autos. E isso não é um detalhe menor: a coluna mete a mão num vespeiro e qualquer tropeço na narrativa pode dar em confusão.

Mas, como tudo começou? A polêmica começou em agosto de 2012, quando a delegada Ana Luíza Caruso se negou a lavrar o flagrante suspeitos de tráfico detidos durante uma operação do MP com o apoio da Brigada Militar. Seu argumento: MP não pode investigar. Simples assim. E é ela quem decidiu isso. E, é claro, foi processada por isso. E foi defendida por seis defensores públicos. Já tinha advogado constituído, abandonou-o, expressamente revogou o mandato antes concedido (está lá no processo) e preferiu os seis defensores públicos. É o relatório!

Ab initio, a delegada e os defensores não poderiam ignorar a lei e o que se diz sobre esta e a própria Constituição. Com efeito, no RS todos sabemos: Não é que a Defensoria ela seja impedida de defender servidores públicos; ela está proibida de defender pessoas que não necessitem da sua assistência, por disporem de recursos suficientes; aí incluídos, caso a caso, os servidores públicos — isso fica mais claro ao longo da coluna, mas é importante não dar margem a mal entendidos. E não sou eu quem diz. É o Supremo Tribunal Federal. Leiamos:

ADI 3022-RS. Art. 45 da Constituição do RS. Alínea “a” do anexo II da LC 9.230/91-RS. Atribuição, à defensoria pública, da defesa de servidores públicos estaduais processados civil ou criminalmente em razão de ato praticado no exercício regular de suas funções. Ofensa ao art. 134 da CF. (...) 2. Declaração da inconstitucionalidade da expressão "bem como assistir, judicialmente, aos servidores estaduais processados por ato praticado em razão do exercício de suas atribuições funcionais", contida na LC 9.230.(...) 3. (...) 4. Ação julgada parcialmente procedente.

Embora o STF já tenha dito tudo isso, a Defensoria insiste que o conceito de hipossuficiência não é de insuficiência de recursos e, sim, “organizacional”. Mas, o que seria isto, a “hipossuficiência organizacional”? Ao que consta, a ideia seria (é) estender a legitimidade para a defesa de grupos que seriam naturalmente desorganizados (usuários de planos de saúde, consumidores etc.). Ora, essa concepção pode ser criticada por mais de uma razão (Ada Grinover também critica esse conceito). Mas, dando de barato e trabalhando com ela, o fato é que ela deve ser harmonizada ao que diz a CF (e, na leitura do STF, a CF — casualmente a “lei maior do país” — fala em “insuficiência de recursos” vou repetir o que diz a CF: “aos-que-comprovarem-insuficiência-de-recursos”. Quem tem dúvida acerca dos limites semânticos e do significado desse enunciado? Binguíssimo. No mais, o dado é que um conceito jurídico indeterminado (conceito ônibus) como esse, vago, não pode ser utilizado como “escudo”, como álibi para que a DPE escolha seus assistidos. Para ser bem claro: Ou bem o sujeito tem o DIREITO de ser atendido pela DPE (e a instituição, em contrapartida, tem o dever de assistência), ou bem não o tem. É a coisa do having a right e do have a duty to. Não há discricionariedade aqui. Não se pode “escolher” o assistido (como se faz no RJ, em que a hipossuficiência fica ao alvedrio de cada defensor). A atuação é casuísta e não universalizável por definição. Todos nós, nesse conceito “elástico”, compomos algum grupo “naturalmente” desorganizado. Outro lance é: que tipo de desorganização expõe o indivíduo à violação de um direito humano?

Para ser bem simples: A Defensoria pode defender qualquer pobre na República. Sendo ele servidor ou não, desde que comprove (sim, comprove) a insuficiência de recursos. O que um (ou seis) defensor(es) não pode(m) é defender quem não é hipossuficiente.

Chamemos o Chapolin Colorado

Em um país carente de recursos, como é possível que a Defensoria se dê ao luxo de deslocar recursos e energias representados por seis competentes agentes para a defesa de alguém que não é hipossuficiente (vejam o que escrevi acima: não foi bem isto o que ocorreu?)? Ou um delegado de polícia é hipossuficiente? Então um prefeito também é. E um deputado? E um promotor? E um juiz? Estão de brincadeira? É a sério isso?

Seria implicância minha, como diriam alguns defensores? O leitor e o contribuinte de Pindorama que decidam...! Ah: posso criar um paradoxo? Se a hipossuficiência não é de recursos (pobreza), e, sim, “organizacional” (sabe-se lá o que este conceito “ônibus” quer dizer), por que os próprios seis defensores — ora noticiados na ação de improbidade — não são defendidos por um ou mais defensores públicos? Pergunta que não quer (e não pode) calar: Qual é o critério para dizer que defensor público não é hipossuficiente e delegado é? Seria o mesmo critério para dizer que o “cara” da "lava jato", diretor de grande empresa, é hipossuficiente? É por que é? Porque sim?

E, permito-me insistir neste ponto: um país em que delegado de polícia é considerado hipossuficiente... sai prá lá. Chamemos o Chapolin Colorado para nos defender. O que resta para os demais brasileiros? Duvido que a maior parte dos defensores do país concorde com o que foi feito na terrae gauche. Duvido também que a maior parte dos defensores concorde com essa coisa chamada de “defensoria como poder popular” (sic)... que está sendo defendido por aí. Se isso vingar, tenho medo que logo surjam “milícias jurídicas” atuando Pindorama a fora. Serão os para-legais jurídicos, aqueles-que-ficam-de-fora-do-botim-estatal. O que me dizem?

Pindorama não vai nada bem. Quando se trata da coisa pública, somos generosos... com o dinheiro da malta. Por isso, os liberais e conservadores de Pindorama estão até “aqui” com a máquina pública e os seus gastos desmesurados. Um dia isso tudo explode. E tenho de dar razão a eles. Por que tudo que é do poder público é tratado de forma tão fácil(itada)? Um cidadão comum jamais teria mais de um defensor (público). Mas uma policial tem... seis. Uau! Calculemos: na medida em que cada defensor recebe o salário de um juiz, são mais de R$ 100 mil por mês dedicados à defesa da doutora delegada (idem ao que adverti acima sobre hipossuficiência). Baita privilégio, não? Quem não quer isso? Fechemos os escritórios de advocacia. Todos queremos ser atendidos pela Defensoria. Somos todos hipossuficientes organizacionais de um modo ou de outro (nous sommes tous hyposufficient organisationnelle, algo como Tout vas três bien, madame Marquise, dizia a malta enquanto o castelo da Marquesa pegava fogo). E com prazos em dobro! Telefonei para um amigo meu na Alemanha e ele disse.... Bem, é impublicável. Porque não acreditava. Nem o mais rico réu da Lava Jato paga mais de R$ 100 mil por mês ao seu causídico.

É isso. Curto e grosso. Tudo o mais o que penso sobre o papel (relevante) da Defensoria no sentido de que ela deve obedecer a Constituição e se restringir à representação de hipossuficientes que comprovem essa condição já o fiz em outras Colunas e textos (mesmo que a DP possa fazer ação civil pública, isso não derrogou o dispositivo da CF que exige a comprovação da hipossuficiência — como fazer isso no bojo de uma ACP? Não sei. O STF que resolva; foi ele que pariu Mateus; o tempo é que dirá o “rolo” que isso ainda causará – parece que tudo em Pindorama está virando estatal; seria o sinuelo do socialismo?). Não vou me repetir aqui.

É importante registrar que, juntamente com o MP, a Ordem dos Advogados do Brasil do Rio Grande do Sul expediu recomendação para que a DP limite sua atuação ao atendimento dos “necessitados e que comprovarem insuficiência de recursos materiais”. Ainda, habilitou-se na ACP como “amicus curiae” em defesa das prerrogativas dos advogados, protegendo “o seu sustento e de suas famílias”. Correta a OAB-RS pela coragem de optar pela legalidade constitucional, mesmo que isso possa parecer, nestes tempos bicudos, antipático.

Vamos ver como a justiça gaúcha tratará desse assunto (sim, sei que em uma decisão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul disse que hipossuficiente é “organizacional” — mas essa decisão é inconstitucional, porque a CF não foi alterada nem revogada — ainda — no mínimo, esse conceito interpretativo deve levar em conta toda a malha conceitual e normativa que o antecede, e que justifica e institucionaliza a Defensoria enquanto agência encarregada da democratização do acesso à justiça, dando voz e vez a quem não a tinha, por... ausência de recursos!). Espero que desta vez o TJ-RS leia corretamente a Constituição e as leis. Pindorama não pode pensar que (já) vivemos em um sistema socialista, em que tudo sai das costas da combalida viúva. Em Pindorama, o esquema tático é “retranca”: preferimos investir mais na defesa que no ataque...se entendem o que quero dizer.

O absurdo chamado pelo próprio nome

Lembram que semana passada falei sobre os acertos “por acaso”? Tratei de Dworkin e vimos, de novo, que questões jurídicas não são questões morais ou teleológicas. E que opiniões coloquiais, o senso comum etc, por vezes coincidem (como um relógio quebrado) com a verdade. É o caso. É uma afronta não ao senso comum apenas, mas ao bom senso mesmo, que todos nós paguemos pela defesa individual de uma Delegada de Polícia. Entendam: não estou dizendo que o Ministério Público tem razão integral, e que se está diante de um ato de improbidade administrativa (coisa que decorreria do desvio de finalidade da atuação da Defensoria). Deixo esse juízo para ser feito por quem de direito, nos autos, em contraditório, na forma da lei e da CF. Meu argumento é: juridicamente, é um absurdo (e o absurdo deve ser chamado pelo nome) o stretch interpretativo feito para abarcar uma situação como essa num caso de hipossuficiência. Politicamente, também! Ou seja, como justificar publicamente, em meio ao amplo debate sobre os limites do Estado Social, sobre o custo dos direitos e tal (ou não estamos todos de acordo que mesmo o direito a saúde, para ficar apenas neste, deve ter algum limite, já que não podemos dar assistência integral a toda à comunidade?), o emprego de recursos públicos para amparar uma situação de necessidade, no mínimo, questionável?

Há alguns dias escrevi aqui sobre a necessidade de termos mais Creonte e menos Antígona em Pindorama. Historicamente interpretou-se que o interesse particular e privado de Antígona pudesse se contrapor ao direito de todos, o direito da polis. Antígona parece que era adepta de certo esquerdismo, uma doença infantil denunciada por Lenin nos anos 20 do século XX. Equivoco. Quem estava certo era Creonte e neste ponto concordo com Sergio Buarque de Holanda, que mostra como a nossa opção por Antigona foi um tiro no pé. Um desastre. Basta ver como a Câmara dos Deputados reservou, no meio do “ajuste fiscal”, nada menos que R$ 1 bi para fazer mais um prédio. Pobre polis pindoramense. O patrimonialismo de Pindorama está ancorado no direito fofinho de Antigona (hoje temos direito a ter três pais, duas ou três mães, tudo em nome de afetividade e outros quetais que não possuem normatividade; amante ganha a metade da herança; faz-se usucapião de terras públicas; políticos dão declaração sentido pena do jovem que esfaqueou o médico no RJ; concede-se três meses a mais de auxilio maternidade para quem tem trigêmeos; solta-se 21 presos com base em argumentos morais-políticos; juiz de direito, com curso de doutorado, diz que, se tiver que fundamentar de acordo com o artigo 489 do novo CPC, vai se mudar para o Zimbawe, etc). Pois é. Antígona venceu! E nós perdemos. Aqui, de minha trincheira, digo: O que precisamos é a firmeza no trato da coisa pública de Creonte. Nossa opção por Antígona ainda vai nos destruir. Aliás, se é que já não nos destruiu.

Uma metáfora final, para entender as “razões de Pindorama”.

Um amigo mandou-me um cálculo que fez. Comprou um saquinho de orégano de 3g por R$ 1,99. Barato, não? Lego engano. O quilo sai por incríveis R$ 633,33. Todos nos enganam fazendo essas embalagens pequenas e fazendo parecer que é barato e bom. E vão comendo pelas beiradas... Esgarçando aos poucos. Tinta para impressora parece barato... Vendida em pequeníssimas porções. Fosse por quilo, duvido que alguém compraria. Custa R$ 13,5 mil. Bom, a champagne Veuve Clicquot custa só R$ 1,29 por mililitro... Quem entendeu a metáfora e me explicá-la amiúde, mande email para lenios@globomail.com. Os que derem as três melhores respostas, ganharão livros — mandem junto o endereço postal com CEP para, se vencedores, receberem via correio.

sábado, 23 de maio de 2015

QUEDA DE BRAÇO INSTITUCIONAL



ZERO HORA 23 de maio de 2015 | N° 18171


CLEIDI PEREIRA
 


Polêmica envolvendo delegada opõe MP e Defensoria Pública


PROMOTOR QUESTIONA o fato de defensores públicos representarem policial acusada de não cumprir suas funções. Caso tem como pano de fundo disputa em torno do poder de investigação



Um caso envolvendo a defesa de uma delegada de polícia em ação judicial opõe Ministério Público (MP) e Defensoria Pública no Rio Grande do Sul. O MP questiona o fato de seis defensores públicos terem representado a policial em um processo no qual é acusada de não cumprir suas funções. A pedido do MP, a Justiça abriu ação civil pública contra os defensores.

A polêmica começou em 2012, quando a delegada Ana Luiza Caruso se negou a prender em flagrante suspeitos de tráfico detidos durante uma operação do MP com o apoio da Brigada Militar. Por esse motivo, ela passou a responder a uma ação civil pública. Um dos autores do processo contra Ana Luíza, o promotor Nilson Rodrigues Filho afirma que ela não realizou as prisões por considerar a ação do MP ilegal. No Brasil, MP e Polícia Civil vivem disputa em torno de qual instituição tem o poder de investigar. Procurada por ZH, Ana Luiza não retornou aos contatos.

A Defensoria Pública acabou envolvida na controvérsia ao assumir a defesa da delegada na ação patrocinada pelo MP. Para Rodrigues, Ana Luiza teria condições de contratar advogado. Além disso, sugere que “a Defensoria comprou a briga da impossibilidade do MP investigar”.

– A Defensoria está instituída para atendimento de carentes. Atendimento fora dessa hipótese caracteriza descumprimento da Constituição, o que é uma ilegalidade – afirma o promotor.

São alvo da nova ação do MP o defensor público-geral, Nilton Leonel Arnecke Maria, e outros cinco defensores: Jaderson Paluchowski, Miguel Seadi Júnior, Alessandro Genaro Soares Lima, Felipe Kirschner e João Otávio Carmona Paz.

A Defensoria contesta a posição do MP. Conforme a subdefensora pública-geral, Luciana Pereira Kern, 500 mil pessoas foram atendidas pela instituição em 2014, sendo 99% dos casos de pessoas que recebem até três salários. O restante corresponde a situações de vulnerabilidade – envolvendo defesa de homossexuais, negros e vítimas de violência doméstica.

Advogado dos defensores públicos, Henrique Poeta Roenick afirma que irá recorrer, mas lembra que a decisão da Justiça apenas dá início ao processo. Segundo ele, a alegação do MP de que a delegada foi procurada pelos defensores é “inverídica”. Roenick ressalta que, mesmo a delegada tendo condições de pagar um advogado, em razão da pressão que ela supostamente estaria enfrentando por parte do MP, a Defensoria “não só poderia como deveria” atendê-la.



O QUE ESTÁ EM DISCUSSÃO
-Em agosto de 2012, o MP instaurou inquérito civil para apurar a conduta da delegada Ana Luíza Caruso, da 3ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA). Ela havia se negado a prender em flagrante oito suspeitos de tráfico, detidos durante uma operação do MP com o apoio da Brigada Militar.
-Durante as investigações, a delegada passou a ser representada pelo defensor público João Otávio Carmona Paz, que apresentou declaração de vulnerabilidade e de hipossuficiência organizacional. Conforme o MP, em depoimento, Ana Luíza informou que estava sendo assistida por um advogado, quando foi procurada pela Defensoria Pública.
-Em dezembro, o MP propôs uma ação civil pública contra seis defensores, já que a delegada “não se enquadraria no conceito de necessitado”.
-Nesta semana, no despacho de recebimento da ação, a juíza Silvia Muradás Fiori afirmou haver indícios suficientes contra os defensores e determinou a citação dos demandados.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

PROCURADORA É CONDENADA PELO STF POR CALUNIAR JUIZ EM BLOG

Revista Consultor Jurídico, 20 de maio de 2015, 20h34

Por Felipe Luchete


Resquícios da satiagraha



A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça condenou uma procuradora da República a oito meses de prisão por ter publicado comentários contra um juiz, durante investigações ligadas à operação satiagraha. Para os ministros, a procuradora regional da 3ª Região Janice Agostinho Ascari cometeu o crime de calúnia ao acusar o juiz federal Ali Mazloum de “exorbitar suas funções”, “blindar e apartar os verdadeiros criminosos e denegrir a imagem dos investigadores”.

Ela também foi condenada a pagar 30 dias-multa (no valor de um salário mínimo vigente à época do fato) e teve direitos políticos suspensos. A pena de prisão foi substituída por restritiva de direitos, com prestação de serviços à comunidade. Por oito votos a cinco, a corte entendeu que houve dolo direto da procuradora no comentário, com intenção consciente de denegrir e atacar a figura do juiz.

O caso ocorreu em 2009, quando Mazloum era responsável por analisar vazamentos de informações de um inquérito que apurava se a operação satiagraha, comandada pelo então delegado da Polícia Federal Protógenes Queirós contra o banqueiro Daniel Dantas, foi arquitetada por iniciativa de particulares. O juiz determinou que fossem enviadas cópias dos autos a pessoas citadas, como o empresário Luiz Roberto Demarco, ex-sócio de Dantas.


Procuradora publicou comentário dizendo que decisão do juiz foi "pró-Dantas".

Em seu blog, Luis Nassif publicou texto sobre o tema, e a procuradora usou o espaço de comentários para fazer críticas ao despacho. Ela escreveu que “o juiz, exorbitando de suas funções, abre uma linha paralela de investigação pró-Dantas, sob o argumento de 'interesses comerciais’”.

“Curioso observar que mesmo Demarco não sendo suspeito ou investigado, o juiz franqueou, a ele e a 6 advogados, acesso a todos os dados do processo, incluindo os dados das ligações telefônicas dos policiais investigados. No Código Penal isso está lá no artigo 325: é mais uma violação de sigilo perpetrada pelo juiz no mesmo processo”, declarou Janice, em outro trecho.

Em queixa-crime, Mazloum disse que que a procuradora ofendeu sua dignidade de magistrado e sua honra de cidadão. Ele afirmou ter sido caluniado com as acusações de abuso de poder, prevaricação e violação de sigilo funcional.

Declaração inaceitável


Para o relator do caso, ministro Og Fernandes, não há como considerar essas palavras como simples comentário, como sustentou a defesa. “O ato de atribuir o comentário de um crime a alguém tem de estar marcado pela seriedade, com aparelhamento probatório, sob pena de incorrer em dolo eventual. É inaceitável que alguém alegue estar de boa-fé quando se abstém de formular contra outrem uma grave acusação”, afirmou.

Mazloum também alegou ter ocorrido difamação e injúria. Mas os ministros absolveram a ré do primeiro crime, por atipicidade, e consideraram extinta a punibilidade por injúria.

Em 2012, o comentário já havia criado um revés para Janice: ela foi condenada na esfera cível a indenizar o juiz em R$ 50 mil por danos morais. O Tribunal de Justiça de São Paulo negou pedido dela e impediu que fosse apresentado Recurso Especial ao STJ. A procuradora chegou a apresentar representação criminal contra o mesmo juiz, mas a solicitação foi negada no ano passado pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

APn 613




Felipe Luchete é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 20 de maio de 2015, 20h34

quarta-feira, 20 de maio de 2015

UM SISTEMA DEFEITUOSO



ZERO HORA 20 de maio de 2015 | N° 18168


EDITORIAIS




É constrangedor para a essência da ideia de transparência no serviço público o fato ocorrido ontem, em ilhas de Porto Alegre, em que uma informação que deveria contribuir para a ação da polícia e da Justiça acabou por favorecer delinquentes. Foi a partir de dados disponibilizados no Banco Nacional de Mandados de Prisão, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que um grupo de 11 pessoas conseguiu fugir, simplesmente porque seus nomes estavam entre os que deveriam ser presos. O caso é um exemplo claro do mau uso de um sistema que deveria estar a serviço da lei e das instituições. O banco referido tem o objetivo de ampliar a possibilidade de localização e apreensão de alguém sob mandado de prisão, desde que essa busca tenha sido inicialmente infrutífera.

Não é razoável que, numa situação em que a surpresa determina o êxito de uma operação, as informações estejam disponíveis para quem tem todo o interesse em antecipar- se às iniciativas de policiais, do Ministério Público e do Judiciário. Lamenta-se que o fracasso da operação signifique desperdício de energia, de recursos e de tempo.

Foram mobilizados 50 policiais em 10 viaturas, numa ação que envolveu até um helicóptero. Os bandidos haviam fugido antes da chegada das forças de segurança, simplesmente porque a estrutura que os assessora alertou sobre os mandados.

Espera-se que, no momento das explicações, não se diga que o Banco Nacional de Mandados funciona assim mesmo e que assim deve continuar funcionando. Está errado. Admitir e corrigir a falha é obrigação dos gestores do serviço, ou o Judiciário estará consumindo recursos para ajudar a manter em liberdade os que, por sua determinação, deveriam estar presos.

INFORMAÇÕES EM BANCO DE DADOS PÚBLICOS IMPEDE PRISÃO DE BANDIDOS

ZERO HORA 20/05/2015 | 11h38

TJ diz que informação sobre operação não deveria ser publicada em banco de dados. Departamento de Homicídios de Porto Alegre não conseguiu prender 11 suspeitos de tráfico de drogas e homicídios nas ilhas do Guaíba



Operação ocorreu na terça-feira Foto: Ronaldo Bernardi / Agência RBS


Cid Martins



Em entrevista na manhã desta quarta-feira à Rádio Gaúcha e após enviar nota à imprensa na noite passada, o desembargador Túlio Martins, do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio Grande do Sul, confirmou que informações sigilosas sobre uma operação policial não deveriam ser publicadas no Banco Nacional de Mandados de Prisão. Devido a isso, na manhã de terça-feira, o Departamento de Homicídios de Porto Alegre não conseguiu prender 11 suspeitos de tráfico de drogas e homicídios nas ilhas do Guaíba. As informações são do blog Caso de Polícia.

Segundo o desembargador, o banco é publico. A ideia é que os mandados de prisão e os processos possam ser acessados por qualquer policial ou juiz em todo o país. No entanto, Martins disse que alguns mandados judiciais são de investigações em andamento e é extremamente importante que tenham uma prescrição de sigilo para que não aconteçam fatos como os de terça. Quando os mandados têm esse caráter reservado, os mesmos possuem um código de identificação. Com isso, eles só podem ser acessados pela autoridade que os requereu.

— O que deu errado foi que o sistema foi alimentado com material sigiloso, que não deveria ter ido para o sistema? — ressaltou Martins.


O TJ está apurando a partir desta quarta qual foi o problema que ocorreu e se houve falha nos procedimentos internos. A polícia reclama que, enquanto os mandados não forem cumpridos, eles têm que ter sempre caráter sigiloso e só podem ser publicados no banco de dados nacional da Justiça após a realização das operações ou prisões em geral.

*Rádio Gaúcha

terça-feira, 19 de maio de 2015

BANDIDOS SÃO AVISADOS DE PRISÕES E FOGEM DE AÇÃO POLICIAL

ZERO HORA 19/05/2015


Avisados de prisões, criminosos fogem de ação policial nas ilhas de Porto Alegre. Polícia Civil cumpriu nove mandados de busca e apreensão na manhã desta terça-feira, mas mandados de prisão acabaram frustrados

por Débora Ely



Foto: Ronaldo Bernardi / Agência RBS

Passava das 6h30min desta terça-feira quando um comboio formado por 50 policiais civis deixou o Palácio da Polícia, em Porto Alegre, em direção às ilhas da cidade. O objetivo era desarticular uma das quadrilhas responsável por aterrorizar moradores das ilhas do Pavão e Marinheiro. Porém, avisados das detenções, criminosos fugiram da ação.

Seriam cumpridos 11 mandados de prisão na região, mas ninguém foi detido. Na casa de suspeitos, familiares e vizinhos relataram que os procurados ficaram sabendo do decreto de prisão preventiva, liberado na semana passada, pela internet — por meio do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), acessível a qualquer cidadão. Assim, escaparam.

A atuação de olheiros — que, às 6h54min, soltaram foguetes para alertar sobre a presença da polícia na área — também prejudicou a operação. Segundo o delegado Filipe Bringhenti, titular da 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), o objetivo da ação era desarticular uma gangue de traficantes da Ilha dos Marinheiros que estava em conflito com um bando especializado em roubos da Ilha do Pavão. Em sete meses, o confronto resultou em cinco mortes e pelo menos oito tentativas.



— O fato de eles saberem que estão sendo procurados atrapalha a efetividade da prisão. O lado bom é que eles saem do local, que fica mais tranquilo. A tendência é que, a curto prazo, não voltem — diz Bringhenti.

Foram cumpridos nove mandados de busca e apreensão em casas das vilas das ilhas do Pavão e Marinheiro. Na casa de um dos principais suspeitos, foi localizado um simulacro.

— Só assim pra andar tranquilo aqui na ilha — disse um morador nesta manhã ao avistar a Polícia Civil na área conhecida por Beco 16.



Conflito começou após morte de traficante

A desavença entre os grupos, que impôs toque de recolher aos moradores e impedia a circulação de pessoas entre as duas ilhas, começou em outubro de 2014. Foi quando o traficante conhecido por Alemão Ovelha foi morto, em Alvorada. A suspeita é que o homicídio do criminoso, que atuava nas ilhas, tenha sido comandado pela gangue da Ilha do Pavão, já que Alemão coibia roubos a pedestres em paradas de ônibus e assaltos a carros. O traficante inclusive ordenaria o assassinato de integrantes do grupo rival. Um homem preso durante as investigações alegou que Alemão era "opressor" — e, por isso, teria sido morto.

Na mesma noite da morte de Alemão, três aliados do traficante foram até a Ilha do Pavão em busca de informações sobre quem teria cometido o assassinato. Eles acabaram mortos lá mesmo. Ao longo da investigação, a polícia já prendeu quatro integrantes do grupo da Ilha do Pavão.

Batizada de Arquipélago III, essa foi a terceira operação policial na região. Foram utilizadas 10 viaturas e um helicóptero na ação — e, com o corte do pagamento de horas extras, agentes que participaram da incursão terão de tirar folgas para compensar o período trabalhado a mais.

sábado, 9 de maio de 2015

MPF NO CONTROLE DOS INQUÉRITOS



Revista Consultor Jurídico, 7 de maio de 2015, 7h27


CJF rediscutirá norma que dá ao MPF o controle sobre inquéritos


Por Pedro Canário



O Conselho da Justiça Federal vai rediscutir a resolução que trata da tramitação de inquéritos diretamente entre Polícia Federal e Ministério Público Federal. A norma, aprovada em 2009 pelo CJF, dá ao MP Federal o poder de autorizar mais prazos para a PF concluir um inquérito, sem que a questão passe pelo Judiciário.

Depois da aprovação de uma emenda ao texto, por requisição da Ordem dos Advogados do Brasil foi criada uma comissão para estudar o tema. O grupo é formado pelo corregedor-geral da Justiça Federal, ministro Jorge Mussi; pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça; pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, desembargador federal Fabio Prieto; por um representante da OAB e um da Associação dos Juízes Federal do Brasil (Ajufe).

Na última sessão ordinária do CJF, foi aprovada uma emenda a essa resolução para dizer que o próprio MP será o órgão responsável por determinar que Procuradoria Regional da República será responsável pelas investigações quando houver dúvida sobre a competência.

Foi o ponto de partida para as disputas. Na prática, a resolução dá ao MP o poder de controlar o inquérito e, em última análise, as investigações. E o Código de Processo Penal diz que essa competência é do Judiciário. Se a resolução, por si só, já diminuía os poderes do juiz no inquérito, a emenda deu ao MP a prerrogativa de, indiretamente, decidir até o foro judicial em que os inquéritos tramitarão.



Para Kayatt, da OAB, controle deve sempre ser feito por autoridade judiciária.
Reprodução

A OAB também acusa que a resolução fere o direito de defesa. Segundo o advogado Marcio Kayatt, conselheiro federal OAB por São Paulo, essa regra impede que o advogado, e, consequentemente, o investigado, tenha acesso ao inquérito. “Se vou à PF, dizem que está com o procurador; se vou ao MP, dizem que está com o delegado. Nisso, o advogado é posto para pular de galho em galho, muitas vezes propositadamente. Por isso o controle deve ser sempre feito por uma autoridade judiciária.”

Kayatt também aponta que, nos processos criminais, o Ministério Público é sempre parte. E se couber ao órgão o controle do inquérito policial, “fica prejudica a paridade de armas”. “A magistratura também fica completamente desprestigiada, passa a ser mera espectadora”, afirma.

Diante da reclamação dos advogados e da magistratura, o presidente do CJF, ministro Francisco Falcão, antes favorável à ideia, decidiu retirar a matéria de discussão e não assiná-la antes que a comissão de estudo chegue a uma conclusão sobre o assunto.


Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

A GUERRA ENTRE JANOT E CUNHA

REVISTA ISTO É N° Edição: 2371 | 009.Mai.15 - 10:13


Até onde pode ir a disputa entre o procurador-geral da República e o presidente da Câmara na Operação Lava Jato


Claudio Dantas Sequeira



As escaramuças ocorridas no início da Operação Lava Jato, quando o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi incluído entre os investigados no esquema do Petrolão, eram apenas um indicativo do que estava por vir mais adiante. O ápice da querela com o MPF se deu na semana passada. Na segunda-feira 4, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu diretamente ao ministro-relator do caso no STF, Teori Zavascki, autorização para ação de busca e apreensão na Central de Informática da Câmara. O gesto foi interpretado como uma provocação. No dia seguinte à solicitação, um integrante da força-tarefa da PGR e peritos em computação copiaram todos os registros digitais da atividade legislativa dos últimos cinco anos. Informações indicam que a coleta de documentos teria incluído o gabinete da Presidência e a residência oficial do parlamentar, onde teria sido apreendido um laptop. Visivelmente acuado, Cunha classificou o episódio como ato de “desespero do procurador”. Como retaliação, o presidente da Câmara voltou a articular a convocação de Janot à CPI da Petrobras para prestar esclarecimentos. “O que foi feito é absolutamente desnecessário. Bastava mandar um ofício. São circunstâncias que mostram o desespero do procurador de tentar encontrar alguma coisa que possa tentar me incriminar”, disse Cunha. O PGR, por sua vez, contra-atacou, afirmando que não lhe cabe dialogar com investigados.



Em parecer enviado ao Supremo, Janot disse há “elementos muitos fortes” capazes de relacionar Cunha com o esquema do Petrolão. As suspeitas sobre o parlamentar aumentaram depois que o doleiro Alberto Youssef, em delação premiada, acusou Cunha de receber propina das empresas Mitsui e Samsung por contratos de locação de sondas para a Petrobras. A interrupção dos repasses teria levado o peemedebista a pressionar as companhias na Comissão de Fiscalização da Câmara, por meio de dois requerimentos de informação que propunham uma devassa nos contratos, aditivos e processos licitatórios da Mitsui com a Petrobras. Mitsui e Samsung eram representadas no Brasil pelo executivo Julio Camargo, delator do Petrolão. Os requerimentos foram assinados pelo deputado Sérgio Brito (PSD-BA) e a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), atual prefeita de Rio Bonito (RJ), ambos aliados do presidente da Câmara. Há duas semanas, descobriu-se que Cunha teria sido o autor dos dois requerimentos, segundo registros digitais do sistema interno da Casa vazados à imprensa. Acuado, ele alegou fraude no Centro de Informática e demitiu seu diretor. Janot, então, solicitou a busca dos documentos para perícia. O procurador-geral desconfia que Cunha estaria por trás de um “balcão de negócios” operado por aliados.

Em 2013, outros dois requerimentos apresentados na Comissão de Minas e Energia pediam a convocação de dirigentes da Petrobras, da Sete Brasil, empresa que também é alvo da Lava Jato, e dos fundos de pensão. Um dos requerimentos foi apresentado pelo deputado Dudu da Fonte (PP-PE), investigado no STF por envolvimento no Petrolão, e aliado de Cunha.



Fotos: Gustavo Moreno/D.A. Press; DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

domingo, 26 de abril de 2015

A NOVA BATALHA DE JANOT

REVISTA ISTO É N° Edição: 2369 | 26.Abr.15 - 10:14


Para não inviabilizar a Lava Jato, procurador-geral da República precisa resolver a queda-de-braço com a PF, marcada por acusações mútuas

Claudio Dantas Sequeira




Nos últimos dias, o procurador-geral da República Rodrigo Janot foi tragado para dentro de uma nova polêmica envolvendo a Operação Lava Jato. A querela decorre do descompasso entre os trabalhos desenvolvidos na primeira instância e no Supremo Tribunal Federal, no que diz respeito aos acusados no Petrolão. Dois relógios que deveriam atuar em harmonia, hoje funcionam de maneiras distintas. Enquanto na primeira instância o juiz Sérgio Moro já decretou a sentença de condenação contra o núcleo administrativo e financeiro do esquema, no STF nenhuma denúncia sequer foi apresentada pelo Ministério Público Federal. Responsável pelas apurações relativas ao braço político do Petrolão, Janot é acusado pela Polícia Federal de travar a investigação, protelando oitivas de pelo menos sete inquéritos relacionados a 40 pessoas e alimentando uma antiga guerra de poderes entre procuradores e delegados. Nos bastidores, delegados se queixam que o procurador-geral quer para si o protagonismo da operação, submetendo a PF a seus desejos. Acusam-no ainda de estar usando a Lava Jato para garantir sua recondução ao cargo. De outro lado, o MP diz que a PF estica a corda de olho em aumentos salariais e numa autonomia orçamentária, administrativa e financeira em relação ao Ministério da Justiça.



Desde que foi alçado ao posto, Janot tem atuado como um equilibrista para evitar incidir em equívocos cometidos por seus antecessores. Ele não quer agir de maneira açodada, para que não incorra no mesmo erro de Aristides Junqueira, responsável pela denúncia contra o então presidente Fernando Collor, que anos mais tarde seria inocentado pelo STF pela inconsistência das provas utilizadas. Nem pretende marcar seu trabalho pela lentidão, para não ser acusado de “engavetador-geral da União”, como Geraldo Brindeiro, conhecido por não dar andamento aos processos contra políticos durante o governo tucano.

O excesso de cuidados, no entanto, não impede o surgimento de problemas com os quais o procurador não esperava se deparar. Conforme apurou ISTOÉ, a contenda começou quando Janot telefonou para o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, no último dia 15, explicando que precisava adiar os depoimentos dos senadores Fernando Collor e Benedito de Lira, e do empresário Alexandrino Alencar, ex-diretor da Odebrecht, previstos para os dois dias subsequentes. O procurador explicou que aguardava o resultado das diligências que fundamentariam os interrogatórios. Daiello teria concordado em remarcar a data das oitivas e pediu que Janot formalizasse isso por ofício. No dia seguinte, porém, o diretor-geral da PF recuou. Alegou que os delegados não concordavam com o adiamento e que o caso deveria ser levado ao ministro Teori Zavascki, do STF. Assim foi feito e o relator acabou autorizando a mudança na agenda, num despacho em que reafirmou a competência do Ministério Público na condução do inquérito.



Para integrantes do MPF ouvidos por ISTOÉ, a postura do diretor-geral da PF no episódio sugere que ele tem dificuldade em comandar sua tropa, daí o descompasso entre as duas instituições que deveriam trabalhar em harmonia. Essa situação teria se tornado ainda mais flagrante com a presença informal do delegado Luis Flávio Zampronha em diversas oitivas. Procuradores da força-tarefa questionaram a participação de Zampronha, alegando que o policial não foi designado oficialmente para a função. Próximo do ex-diretor da PF Paulo Lacerda, Zampronha integrou a Divisão de Combate a Crimes Financeiros da PF que investigou a fundo o mensalão. A expertise do delegado justificaria sua participação no caso, desde que isso fosse formalizado, alegam os procuradores. Caso contrário, só tende a alimentar a disputa entre a PF e o MPF e as insinuações mútuas de que alguém quer atrapalhar as investigações. “Não há necessidade de um ato formal. Nenhum delegado foi designado oficialmente”, rebateu Zampronha.

Certo é que, após a manifestação de Teori, a PF resolveu reagir por meio do presidente da Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro. Em nota, disse que os delegados federais estavam preocupados “com os prejuízos à investigação criminal” e com o “atraso de diligências”. Ato contínuo, em blogs surgiram acusações de que a PF estaria usando a Lava-Jato como barganha para aprovar a PEC 412, que prevê autonomia orçamentária, administrativa e financeira para a instituição. Audiências públicas de Leôncio com parlamentares para defender a “PEC da autonomia” foram interpretadas como provas de um “balcão de negócios”. “É uma insinuação ridícula e despropositada”, disse à ISTOÉ. É o que todos esperam.



Fotos: Sergio Lima/Folhapress; Marcelo Ferreira/CB/D.A Press ; PAULO LISBOA/BRAZIL PHOTO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

terça-feira, 14 de abril de 2015

DELEGADO CONCILIADOR

ESTADO DE MINAS 09/02/2015 07:33


Governo de Minas vai implantar medida inédita para aliviar superlotação nas prisões. Minas pretende criar este ano a figura do delegado conciliador, que passará a resolver casos que envolvam crimes de menor gravidade, até mesmo com aplicação de penas alternativas
 
Maria Clara Prates



Interior do complexo prisional de Neves: em Minas, total de presos sem julgamento passa de 30 mil, quase a metade da população carcerária


Com um déficit de 24,5 mil vagas no sistema prisional do estado e uma superpopulação carcerária de 64,7 mil presos, a Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais vai implantar uma experiência pioneira, o Núcleo de Pacificação Social e Conflito Criminal, por meio do qual o próprio delegado deverá resolver casos envolvendo crimes de menor potencial ofensivo – contravenções penais e aqueles com pena máxima de dois anos. A informação foi passada com exclusividade ao Estado de Minas pelo secretário-adjunto de Defesa Social, delegado federal Rodrigo Teixeira. Ele explica que, com a medida, o delegado, na presença de um advogado do acusado, passa a promover a composição civil, que deverá ser homologada por um juiz de Direito, depois de ouvido o Ministério Público (MP).

A expectativa é de que o núcleo seja implantado dentro de até nove meses, praticamente a custo zero, já que poderão ser usadas as instalações das próprias delegacias. Para garantir eficácia, os policiais civis receberão treinamento no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em Minas, o número de presos provisórios, ainda sem julgamento, chega a 30.349.





O secretário de Defesa Social, Bernardo Santana (PR), que deu o tom da sua gestão à frente da pasta, quando se comprometeu a valorizar os policiais – civis, militares e bombeiros –, vai se reunir nos próximos dias com representantes do Tribunal de Justiça de Minas (TJ), Ministério Público (MP), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entre outras entidades da área de segurança pública, para viabilizar a criação da figura do delegado conciliador. Ou seja, um delegado que atue como um juiz de instrução, decidindo sobre a necessidade da prisão em flagrante, a arbitragem de fiança, como já ocorre, e até mesmo a aplicação de penas alternativas em transações penais e uso de tornozeleiras. Em casos de abusos, o policial seria punido e a decisão revista.

De acordo com Rodrigo Teixeira, a criação do Núcleo de Pacificação Social independe de regulamentação, porque a Lei 9.099, de setembro de 1995 – que criou os juizados especiais cíveis e criminais –, estabelece que as mediações dos conflitos podem ser feitas por juízes ou por leigos. “Essa iniciativa não depende de regulamentação, por isso

, podemos fazer a implantação em no máximo nove meses, instituindo a figura do delegado conciliador”, diz Teixeira. Ele explica, porém, que a figura do delegado de instrução vai exigir uma regulamentação formal e um consenso de todos os envolvidos no processo. “Se o delegado já tem o poder de arbitrar fiança ou manter uma prisão, por que não poderia determinar o uso de tornozeleiras e outras medidas cautelares?”, avalia Teixeira, ao defender que, desta forma, haverá mais agilidade na punição efetiva dos suspeitos.

CAMINHO INVERSO

Sob a mesma alegação de agilização e redução do total de presos provisórios, São Paulo escolheu caminho em sentido contrário. A partir de amanhã, todos os presos na capital terão que ser conduzidos dentro de 24 horas ao Complexo Judiciário Ministro Mário Guimarães, em Barra Funda, onde vai funcionar a Central de Mediação Penal. Para se ter ideia do volume de trabalho no novo centro, somente no segundo semestre de 2012 – último levantamento feito pela organização não governamental Sou da Paz –, 8.108 prisões foram feitas na capital paulista, média diária de 45. Para o secretário Bernardo Santana, a proposta é um grave risco para a solução da segurança pública, um risco para o Judiciário e um engessamento do sistema. “Em Minas, o governador não nos incumbiu de missões espalhafatosas e pirotécnicas, pouco efetivas na segurança pública”, disse.

A iniciativa paulista encontra sustentação no Projeto de Lei 554/2011 – de autoria do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), que cria a figura do juiz de instrução e praticamente suprime o inquérito policial –, em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). De acordo com o projeto de lei, todos os presos deveriam ser apresentados dentro do prazo de 24 horas ao juiz, que já realizaria uma audiência de custódia, com participação indispensável do Ministério Público e advogados e já poderia dar uma sentença. A ideia foi encampada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que lançou oficialmente o sistema na sexta-feira. A medida foi viabilizada por meio de um termo de cooperação assinado com o Ministério da Justiça, CNJ, MP, Defensoria Pública, OAB, entre outras entidades.

DIREITOS O presidente da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro, alerta que a concentração de todos os presos em um único ponto vai exigir um grande esquema de segurança no local para evitar resgate, especialmente na cidade onde é berço da violenta facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), que resiste nos presídios paulistas. Marcos Leôncio lembra ainda que o projeto de lei que altera o Código de Processo Penal pode se tornar inviável também em cidades sem juiz e Ministério Público ou defensores públicos, como ocorre hoje em inúmeras comarcas do país. “Dessa forma, estão transformando o Juizado de Instrução, num grande alvo sensível para o crime organizado”, diz o federal. Uma linha de raciocínio que tem o apoio quase unânime de outras carreiras jurídicas e também no Ministério Público (veja quadro abaixo).

Em nota técnica enviada ao Senado, em abril, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa, mostra preocupação com a segurança, mas alerta para outro complicador: o alto custo da implantação da medida. “São imensuráveis os custos decorrentes da implementação dessas medidas, a serem arcados quase que exclusivamente pelos governos estaduais”, diz. Para o procurador, o prazo de 24 horas apenas para a apresentação da pessoa presa é extremamente exíguo e pode inviabilizar a aplicação. De acordo com o delegado Marcos Leôncio, a Bahia já tentou implementar o juízo de instrução, mas não consegue realizar a audiência de custódia antes de 20 a 30 dias após a prisão.

Sem consenso

Posição das entidades em relação ao Juizado de Instrução adotado pelo governo de São Paulo

Pela rejeição
Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF)
Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol do Brasil)
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)
Associação Paulista de Magistrados (Apamagis)
Federação Nacional dos Delegados de Polícia (Fenadepol)
Ministério Público de São Paulo (MPSP)
Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil (CONCPC)

Pela aprovação
Poder Judiciário do Rio de Janeiro (PJERJ, com emenda)
Colégio Nacional dos Defensores Públicos Gerais (Condege)
Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep)
Fonte: Senado Federal