ZERO HORA 31 de outubro de 2015 | N° 18341
ENTREVISTA
“Não trabalhamos na segurança pública”
PAULO AUGUSTO DE OLIVEIRA IRION - Juiz da Vara de Execuções Criminais da Capital
Responsável pela decisão que concedeu prisão domiciliar ao suspeito, o juiz Paulo Irion diz que a medida cumpre a lei.
Como é possível um homem com três condenações por estupro estar em prisão domiciliar?
Desde 2009, toda progressão ao regime aberto se converte em prisão domiciliar. É o esgotamento do sistema prisional. Vale para todos. É uma decisão corriqueira na VEC.
Em se tratando de um estuprador não se poderia tê-lo mantido preso?
Não, porque se ele atende aos requisitos, a lei tem de ser cumprida. No caso dele, pesou o fato de que, desde 2004, não comete delitos. Ou seja, no momento da progressão, tinha mais de 10 anos sem outro crime. Foi um dos elementos levados em consideração.
Em prisão domiciliar, corre-se o risco dele voltar a estuprar.
Aí, vai responder pelo novo crime. É a regra do jogo. Não trabalhamos na segurança pública para evitar que outros crimes ocorram.
VIOLÊNCIA SEXUAL. Suspeito de estupros em série é preso, de novo. SETE ATAQUES nos últimos 12 anos teriam sido praticados por homem que cumpria pena em casa
Condenado três vezes por estupro, cujas penas somadas chegam a 15 anos, Esequiel da Silva Porto, 33 anos, foi preso mais uma vez ontem e deve ser indiciado por dois novos ataques cometidos entre junho de 2014 e outubro deste ano. O homem, que também é suspeito de outros dois estupros – ainda sob apuração – cumpria prisão domiciliar desde fevereiro.
Por quatro vezes, a Justiça entendeu que ele merecia progressão de regime das penas que cumpria. Nesses relaxamentos, fugiu: foram quatro escapadas entre 2013 e 2014, quando estava no regime semiaberto. Em junho de 2013, danificou uma tornozeleira eletrônica. Um dos últimos ataques atribuídos a ele ocorreu enquanto era foragido, em junho de 2014.
– Agora esperamos que, com tudo isso, com pelo menos mais dois casos comprovados, ele fique no regime fechado por um bom tempo – afirma a delegada Marina Dillenburg, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Gravataí.
Em cumprimento de mandado de busca na residência onde Porto morava com a mãe, no bairro Palermo, em Gravataí, a polícia encontrou bolsas, sutiãs e outros objetos femininos, que seriam recordações guardadas das vítimas dos ataques.
Duas horas após revistar a casa, os policiais localizaram Porto sob a ponte que liga Cachoeirinha à Capital, onde havia passado a noite.
– O que fiz? É mentira isso que estão dizendo. Foi tudo de boca. Estão inventando, é mentira – afirmou aos policiais da Deam e do Grupamento de Operação Especiais (GOE), que prestaram apoio.
– A última vítima o reconheceu sem sombra de dúvida – afirma a delegada, acrescentando que o suspeito sempre usava faca ou arma de fogo nos atasques.
A partir do relato da mulher, a delegada identificou semelhança com um caso de 2014. Porto acabou reconhecido por foto pela vítima daquele estupro. Para tentar comprovar outros casos, foi recolhido material genético de pertences de Porto para comparação com amostras recolhidas das vítimas.
LEANDRO RODRIGUES
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - SE A JUSTIÇA NÃO TRABALHA NA SEGURANÇA PÚBLICA, QUAL É A SUA FINALIDADE PÚBLICA NA APLICAÇÃO DAS LEIS, NOS PROCESSOS, NA EXECUÇÃO PENAL E NA GARANTIA DE DIREITOS À POPULAÇÃO?
Porém, não se pode culpar o magistrado e sim a cultura leniente e permissiva praticada dentro da justiça de que são instrumentos separados e não comprometidos com o direito dos cidadãos e das comunidades à segurança pública. Só que fazem parte de um sistema em que a justiça é o pilar de sustentação na aplicação das leis e na garantia de direitos, inclusive os de justiça para as vítimas e o de segurança para TODOS na preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.
A justiça trabalha sim na segurança pública, pois o Brasil se constitui num Estado Democrático de Direito e o papel do judiciário é garantir a democracia, as leis, a justiça e os direitos. Afinal para que servem os bem pagos instrumentos de justiça? Quais são as obrigações dos órgãos da execução penal? Deixar criminosos e psicopatas nas ruas cometendo crimes?
MUDANÇA DE POSTURA JUDICIAL, REFORMA DA JUSTIÇA BRASILEIRA E APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE NA EXECUÇÃO PENAL. Por uma urgente mudança de postura na justiça com uma reforma ampla dos instrumentos e da legislação, além da devida apuração de responsabilidade dos órgãos da execução penal diante do "esgotamento do sistema prisional".