quinta-feira, 6 de setembro de 2012

CASO BECKER PASSA A SER FEDERAL

 
ZERO HORA 06 de setembro de 2012 | N° 17184

REVIRAVOLTA NO TRIBUNAL

Anulado processo do Caso Becker. Por decisão do STJ, assassinato do ex-presidente do Cremers, ocorrido em 2008, sai da Justiça Estadual e passa para a Federal

CARLOS WAGNER

Um novo capítulo foi acrescentado a um dos mais polêmicos casos de polícia das últimas décadas no Rio Grande do Sul. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou o processo que tramitava na 1ª Vara do Júri, em Porto Alegre, sobre o assassinato do então vice-presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremers), o médico oftalmologista Marco Antonio Becker. O STJ determinou que o caso seja transferido para a Justiça Federal, que deverá decidir se inicia ou não um novo processo.

Becker foi morto a tiros na noite de 4 de dezembro de 2008, na Rua Ramiro Barcelos, na Capital. Segundo as investigações da polícia, o mandante do crime teria sido o ex-médico Bayard Fischer dos Santos, que está em liberdade provisória. Há outros 10 réus, entre eles Moises Gugel, assessor de Bayard, que também está em liberdade provisória.

Gugel é acusado de ter intermediado o contato entre o seu chefe e o traficante Juraci Oliveira da Silva, conhecido como Jura, que está preso por outros crimes. Jura teria enviado os pistoleiros que executaram Becker. O motivo do crime seria o fato de o médico ter sido o responsável pela cassação do diploma de Bayard.

Em 2010, o advogado de Gugel, Marcos Vinicius Barrios, entrou no STJ com um habeas corpus pedindo que o caso fosse transferido para a Justiça Federal. Alegava que, sendo o Cremers o representante do Conselho Federal de Medicina no Estado e que o motivo do crime, segundo o Ministério Público do Estado (MPE), teria sido a cassação do diploma médico do suposto mandante do crime, o processo deveria tramitar na Justiça Federal.

– A minha tese foi vencedora. O processo foi anulado e nasce um novo caso na esfera federal – afirma Barrios.

O advogado acredita que seu cliente terá melhor chance de contar a sua versão na Justiça Federal. Opinião semelhante tem João Olímpio de Souza Filho, que defende Bayard.

– Na Justiça do Estado, o meu cliente não teve chance de contar a versão dele. O MP afirma que o motivo do crime foi o fato de Becker ter cassado o diploma do Bayard. Só que, em 2006, quando houve a cassação, Becker não estava presente. Na Justiça Federal, acreditamos que esse e outros fatos serão levados em conta – disse Olímpio.

Alguns atos poderão ser aproveitados

Os dois advogados negam que se trata de uma manobra para ganhar tempo. O promotor do caso, Jorge Alberto Alfaya, estuda um possível recurso contra a decisão da ministra Laurita Vaz, do STJ, anulando o processo que tramita, em fase de instrução, na 1ª Vara do Júri. Porém, a ministra afirma que poderão ser aproveitados os atos não decisórios que compõem o processo. Ou seja: o inquérito policial, que inclui as perícias técnicas, as reconstituições feitas pela polícia e os depoimentos de testemunhas.

Na terça-feira, o juiz da 1ª Vara do Júri, Volmei dos Santos Coelho, foi informado sobre a decisão. Ainda naquele dia, ele despachou o processo para a Justiça Federal. O caso deverá tramitar na 2ª Vara Criminal Federal de Porto Alegre, que ainda não recebeu a documentação.


SUA SEGURANÇA | HUMBERTO TREZZI

De volta ao começo

A decisão de transferir para o âmbito federal o julgamento do rumoroso Caso Becker traz uma série de consequências. A principal delas é que joga água fria na fervura dos que desejam um processo rápido. Conforme apurado pelo repórter Carlos Wagner, tudo vai recomeçar, quase da estaca zero. Pelo menos no âmbito judicial. Só não é um total retrabalho porque o que foi feito pela Polícia Civil e pelo Instituto-geral de Perícias continuará valendo.

O calhamaço com milhares de páginas de investigações e interrogatórios será agora analisado por outro procurador e outro juiz. Só para ler tudo isso muito tempo será consumido. E ainda existe a possibilidade de o Ministério Público Federal pedir novos interrogatórios, investigações complementares e outras providências costumeiras em casos de homicídio como esse. Sem falar numa complicação adicional: procuradores e juízes federais estão pouco acostumados a lidar com episódios de assassinato.

É provável que, devido ao tempo que transcorrerá até que as autoridades federais examinem o caso, prescrevam crimes correlatos ao suposto complô para assassinar o vice-presidente do Cremers – como é o caso da formação de quadrilha. Como se vê, os advogados de defesa souberam usar muito bem as portas abertas deixadas pela legislação brasileira.


O que vai acontecer
1) O caso deverá tramitar na 2ª Vara Criminal Federal de Porto Alegre por ser a que tem competência para realizar julgamento pelo tribunal do júri
2) O acervo do inquérito policial depoimentos, perícias e reconstituições e os depoimentos dados em juízo deverão ser entregues a um procurador da República. Ele deverá analisar os documentos e poderá tomar as seguintes decisões:
a) Ratificar a denúncia feita pelo seu colega do Ministério Público Estadual
b) Fazer uma nova denúncia
c) Determinar que a Polícia Federal (PF) faça investigações complementares
d) Em tese, pode pedir o arquivamento do caso
3) Se o procurador da República oferecer a denúncia, ela será analisada pelo juiz. Se ele aceitá-la, inicia-se um novo processo com os prazos estabelecidos em lei para as partes se manifestarem
Fonte: Fonte: assessoria da Procuradoria da República
Morte rumorosa
- Na noite de 4 de dezembro de 2008, o oftalmologista e vice-presidente do Cremers Marco Antonio Becker é morto a tiros dentro de seu carro depois de ser abordado por dois homens em uma moto na Rua Ramiro Barcelos, no bairro Floresta, na Capital.
- Em 11 de dezembro de 2009, a Polícia Civil indicia o ex-andrologista Bayard Fischer dos Santos e mais quatro pessoas. Conforme as investigações, o traficante de drogas Juraci Oliveira da Silva, o Jura, teria intermediado o assassinato, e os executores seriam dois comparsas.
- No dia 22 de dezembro, a promotora Lúcia Helena de Lima Callegari encaminha a denúncia à Justiça. Ela inclui oito pessoas pelo assassinato na ação, três a mais do que o número de indiciados pela polícia.
- Becker teria sido assassinado por vingança, segundo o Ministério Público, por ter presidido a sessão de cassação do direito de Bayard Fischer dos Santos de exercer a medicina.
- No dia 29, a Justiça aceita a denúncia contra o ex-andrologista e outras 10 pessoas – das quais sete por participação no crime. Um dos réus, Fabiano Silva do Nascimento, o Fio, foi excluído da ação porque foi assassinado.
- Em 30 de dezembro de 2009, o Ministério Público divulga as primeiras escutas usadas como provas. Nas gravações autorizadas pela Justiça, Bayard Fischer dos Santos é citado como mandante do crime.
- Em maio de 2010, o traficante Jura é preso no Paraguai.
- Em 2 de agosto, começam os depoimentos da acusação no Caso Becker
- Em 14 de abril de 2011, foi determinada a libertação de Bayard, preso em 11 de fevereiro de 2010, e de outros cinco presos. Conforme a 2ª Câmara do Tribunal de Justiça, os réus ficaram mais de um ano presos e por isso podem responder pelos delitos em liberdade.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É MAIS UMA PROVA DA INSEGURANÇA JURÍDICA QUE VIGORA NO BRASIL, FOMENTANDO VÁRIAS INTERPRETAÇÕES DE COMPETÊNCIA, MOROSIDADE, RETRABALHO E IMPUNIDADE.

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